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EUA

Após envio de tropas, autoridades da Califórnia elevam o tom contra Trump

Governador Gavin Newsom disse que o presidente "está usando os militares dos EUA contra os cidadãos", e prefeita de Los Angeles vê cidade como balão de ensaio trumpista

A decisão (unilateral) do presidente dos EUA, Donald Trump, de enviar quase 5 mil militares a Los Angeles para enfrentar protestos contra sua política migratória foi alvo de reações incisivas das autoridades locais, que incluiu palavras duras, acusações de violação dos direitos dos cidadãos e questionamentos nos tribunais.

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O principal expoente do “duelo” com Trump é o governador Gavin Newsom, democrata e apontado como um dos potenciais candidatos à Casa Branca em 2028.

No fim de semana, em meio aos protestos e confrontos nas ruas de Los Angeles entre as forças de segurança e os manifestantes pró- imigração, Trump decidiu enviar dois mil integrantes da Guarda Nacional da Califórnia para a cidade, a fim de ajudar na contenção de atos violentos e proteger prédios federais.

Mas ao contrário de mobilizações similares no ado, como na própria Los Angeles em 1992, envio das tropas ocorreu por decisão do próprio Trump, e não a pedido do governador, como normalmente acontece nos EUA. Newsom disse que não havia necessidade do apoio externo, que os protestos estavam perdendo força, e que “a atitude é propositalmente inflamatória e só aumentará as tensões”.

Enquanto as forças chegavam — ao todo, foram mobilizados quatro mil militares da Guarda Nacional, além de 700 membros do Corpo de Fuzileiros Navais — a guerra verbal recebia mais munição. No domingo, o czar de imigração do governo Trump, Tom Homan, disse que “ninguém estava acima da lei”, e não descartou prender políticos do Partido Democrata caso interferissem em suas operações para capturar imigrantes no estado.

Newsom desafiou Homan a prendê-lo…e Trump disse que, caso fosse o czar da imigração, levaria o governador da Califórnia algemado. A resposta foi imediata.

“O presidente dos Estados Unidos acaba de pedir a prisão de um governador em exercício. Este é um dia que eu esperava nunca ver na América”, escreveu Newsom na rede social X. “Não importa se você é democrata ou republicano, esta é uma linha que não podemos cruzar como nação — este é um o inconfundível em direção ao autoritarismo.”

O procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, entrou com uma ação questionando a constitucionalidade do envio das tropas, e acusou o presidente de “se envolver em uma tomada de poder ilegal”. Nesta terça-feira, foi feito um novo pedido, em caráter de urgência, para suspender a mobilização militar.

— Ele tentou se apropriar de uma autoridade que não tem. Ele não pode enviar legalmente a Guarda Nacional para Los Angeles, ponto final. O estatuto que ele cita não lhe confere essa autoridade. É preciso haver uma invasão, uma rebelião ou a incapacidade de executar as leis dos Estados Unidos. Nada disso está presente — disse Bonta à rede CNN.

Nesta terça-feira, a prefeita de Los Angeles, a democrata Karen Bass, disse que as autoridades municipais não foram informadas com antecedência sobre as operações migratórias — que serviram de fagulha para os protestos —, que as forças de segurança locais estão no controle da situação e questionou as decisões da Casa Branca.

— As pessoas me perguntam: "O que os fuzileiros navais vão fazer quando chegarem aqui?" Essa é uma boa pergunta. Não tenho a mínima ideia — afirmou em entrevista coletiva, revelando o desejo de conversar por telefone com Trump. — Quero dizer a ele para parar com as operações [migratórias]. Quero dizer a ele que esta é uma cidade de imigrantes. Quero dizer a ele que, se você quer devastar a economia da cidade de Los Angeles, então ataque a população imigrante.

Newsom, por sua vez, acusou o governo federal de mandar as tropas a Los Angeles sem as condições ideais para desempenharem suas funções, sejam elas quais forem — na véspera, havia chamado o envio de fuzileiros ao estado de "ditatorial".

“Seu Querido Líder enviou tropas americanas para cá sem combustível, água ou comida”, escreveu Newsom no X, em resposta ao secretário de Veteranos, Doug Collins, e usando um adjetivo no ado destinado ao líder da Coreia do Norte, Kim Jong-il. “Se alguém deveria se preocupar em desrespeitar aqueles que servem à nossa nação, deveria ser você e sua istração.”

Diante das câmeras, Trump afirmou que ele foi o responsável por controlar os protestos com o envio da Guarda Nacional, disse que poderia invocar o Ato de Insurreição, do Século XIX, o que daria aos militares poder de polícia, e revelou que havia conversado com Newsom. O governador discordou.

“Não houve nenhuma ligação. Nem mesmo uma mensagem de voz. Os americanos deveriam estar alarmados com o fato de um presidente que envia fuzileiros navais para as nossas ruas nem saber com quem está falando”, escreveu o governador no X.

Para Karen Bass, que deu a entrevista coletiva enquanto veículos militares se dirigiam à cidade que comanda, as decisões de Trump sobre Los Angeles são um balão de ensaio para planos mais amplos.

— Acho que somos um experimento, porque se vocês conseguem fazer isso com a segunda maior cidade do país, talvez o governo esteja esperando que isso seja um sinal para que todos, em todos os lugares, tenham medo deles — afirmou aos jornalistas — Que o governo federal, que historicamente os protegeu, possa entrar e assumir o controle.

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